A palavra "atopia", de origem grega, tem uma conotação intrigante, significando literalmente "fora de lugar", implicando algo estranho, extravagante e inclassificável. Sua aplicação nesse contexto é especialmente relevante, considerando que, quando foi inicialmente reconhecida, o entendimento da bioquímica e das diversas vias moleculares complexas presentes na fisiologia dos organismos vivos era significativamente limitado em comparação ao conhecimento atual. O Comitê Internacional de Doenças Alérgicas dos Animais (ICADA) define a dermatite atópica como uma condição inflamatória hereditária da pele, comumente pruriginosa e predominantemente mediada por células T, que envolve anormalidades na barreira cutânea, sensibilização a alérgenos e alterações na microbiota.
A epiderme forma uma barreira física crucial para proteger o organismo dos animais contra os elementos externos. Essa barreira, especialmente representada pela camada mais externa conhecida como estrato córneo, é essencialmente composta por queratinócitos anucleados envoltos em uma matriz lipídica lamelar, que pode ser comparada a uma estrutura de "tijolo e cimento". Infelizmente, em cães afetados pela dermatite atópica, observa-se uma disfunção nessa barreira cutânea. Estudos in vitro com queratinócitos de pacientes atópicos revelam diferenças significativas em termos de crescimento, capacidade de conexão e permeabilidade, quando comparados a animais saudáveis. Essa maior permeabilidade pode ser atribuída à irregularidade ou expressão não uniforme das proteínas responsáveis pela coesão celular, sendo um problema para manter a função protetiva desse animal.
A presença de respostas imunológicas aberrantes em animais atópicos é evidente. As células T reguladoras estão significativamente aumentadas nestes animais, com uma combinação das células Th2, Th1 e T reguladoras no estágio crônico, enquanto nas reações agudas observa-se a ativação das vias Th2/Th22 e um aumento na expressão gênica para interleucina 31. A IL-31, sendo um alvo terapêutico para alívio do prurido, desempenha um papel crucial em sua mediação, além de exercer funções complexas, como a supressão da diferenciação epidérmica devido a presença de receptores nos queratinócitos para essa citocina. Além da ativação dessa via molecular, várias outras estão presentes e são estudadas para melhor compreensão de tal doença.
Além desses fatores, é evidente que a população microbiana comensal da pele é de extrema importância para o animal. Esses microrganismos estão bem adaptados à vida na superfície epitelial, superando os patógenos menos adaptados. A pele do atópico é caracterizada por alteração no pH, resultando em algumas alterações nas proteínas de junção celular, além da diminuição da biodiversidade do microbioma e aumento de Staphylococcus. Ao longo dos anos, tem se observado uma super colonização progressiva dessa bactéria como consequência da pele inflamada nos animais atópicos, tornando cada vez mais evidente que ela, com suas proteínas e toxinas da parede celular, pode induzir reações semelhantes por si só.
Diversos experimentos e estudos estão sendo feitos em busca de biomarcadores que englobam as principais alterações citadas no texto, encontradas em pacientes atópicos. Com os avanços tecnológicos, as análises mais amplas de quimiocinas e citocinas têm facilitado esses estudos. Sendo os alvos principais, as citocinas derivadas de queratinócitos e as citocinas derivadas das linhagens de célula T. O entendimento de todas essas vias moleculares nos mostrará a etiologia e a fisiopatologia da doença. Revelando novos biomarcadores para o diagnóstico, e também os alvos terapêuticos mais eficientes, com menos efeitos adversos ao paciente. Podendo assim nos mostrar se os conhecimentos que temos hoje são uma causa primária, secundária à inflamação ou, até mesmo, a combinação de ambos.
REFERÊNCIAS:
1. FRANCO, Jackeline, et al. Local and systemic changes in lipid profile as potential biomarkers for canine atopic dermatitis. Metabolites, 2021, 11.10: 670.
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